Quando pensei em escrever esse artigo tive uma enxurrada de ideias... abordar a mentoria, organizacional ou pessoal, olhando para frente, através das lentes desse futuro que emerge.
Pensei com meus botões: trata-se de uma lógica simples, é entender o que as pesquisas falam sobre o que o mundo está precisando e associar à busca de uma estrutura onde pessoas mais experientes orientem, aconselhem sobre esta ou aquela tendência dentro de um framework estruturado.
Santa inocência.
Na primeira busca já me deparo com uma pesquisa da Intoo[1] com a Workplace Inteligence mostrando que 47% da GenZ participante da pesquisa prefere ter como mentor para desenvolvimento de sua carreira o ChatGPT e 62% deles dizem que o gestor está muito ocupado para fazer conversas de carreira com eles.
Essa informação já me faz refletir sobre o que eles estão buscando de verdade. Dicas do que aprender? Instruções claras do que fazer para cuidar da própria carreira?
Seria isso mentoria ou um exemplo de uso reduzido da palavra? Escolho seguir pela segunda opção.
Sim, acredito que a Inteligência Artificial pode ser uma ferramenta incrível para receber um monte de dicas e alternativas de desenvolvimento, acredito também que afunilando a conversa com ela é possível, inclusive, desenhar os melhores trajetos para o desenvolvimento de uma carreira.
Mas é aí, nesse “afunilando a conversa” que entendo que o mentor entra... afunilar a conversa significa ter uma compreensão sistêmica do contexto que estou inserido, obter uma percepção experiente da situação especifica que tanto a pessoa quando a organização que ela pertence estão inseridas, ter uma escuta dos medos, obstáculos e histórias que compõem uma jornada. Enfim, ter uma pessoa que te inspira, ali, inteira para você.
Lembrei dos meus mentores, das perguntas que eles fizeram que mudaram a minha vida, do apoio que recebi quando a estratégia não deu certo e da admiração que sentia por cada um deles. Convenci-me que, pelo menos por enquanto, a inteligência artificial não substitui um mentor.
Santa inocência 2.
Precisei passar por essa reflexão para poder me movimentar para as tendências e maiores preocupações das organizações e lideranças atualmente para conseguir construir a narrativa em torno do mentoring.
Me deparei com textos pasteurizados sobre os benefícios do mentoring para a empresa, para o mentorado e para o mentor. Se você estiver buscando uma lista desses benefícios, acredito que o ChatGPT ou Google AI podem te dar uma lista bem melhor do que poderia escrever aqui, mas esse não era meu propósito.
Quero aqui conectar mentoring com as necessidades das organizações nesse futuro que emerge.
Oportunidade.
Voltando para as pesquisas, segundo a Gallup[2], os dois temas cruciais que devem ser observados nos locais de trabalho em 2024 (o ano já está acabando, né?) são Saúde Mental e DE&I.
A mesma pesquisa traz que o modo como os colaboradores são gerenciados influencia 4x mais o engajamento e o bem-estar que a atividade em si que estão desenvolvendo.
Especialmente no que tange DE&I, os programas de mentoria interna podem ser uma grande alavanca para a área de Recursos Humanos desenvolverem não apenas esse recorte da população como também proporcionar um banho de realidade para os mentores, que poderão se deparar com os obstáculos de quem é minoria; ao mesmo tempo estarão aumentando o engajamento dos mentorados participantes e realmente fomentando uma cultura de impulsionamento da diversidade.
Mas aqui preciso relembrar o calcanhar de Aquiles de um programa de mentoria organizacional de sucesso: ele precisa estar alinhado, de verdade, com os objetivos estratégicos da organização e aderente à cultura organizacional.
Um programa disruptivo de mentoring interno com foco em DE&I "vai dar ruim" caso o tema não esteja realmente na pauta da estratégia e os mentores capacitados para receberem seus mentorados, como diria Otto Scharmer, de mente, coração e vontade abertos. Ou seja, como sempre, toda oportunidade tem seu risco.
Oportunidade 2.
Segundo a Korn Ferry, a tendência para 2025[3] é que a liderança adote uma mentalidade que eles chamaram de “future-forward”. Para eles isso significaria ser um líder com agilidade na aprendizagem, preparando-se rapidamente para entender e navegar no mundo da IA sendo muito adaptável às novas tecnologias.
Esse líder, com o apoio de toda essa tecnologia, é capaz de tomar decisões de maneira mais eficiente aumentando a resiliência das organizações onde atua.
Outra tendência para 2025 é a de incorporar uma cultura de aprendizagem contínua nos programas de liderança, assim, se o líder demonstra um comprometimento com sua própria aprendizagem, ele fomenta um ambiente de aprendizagem em toda a organização.
E onde o mentoring se encaixa nisso? Eu comecei esse texto falando da inteligência artificial como substituto do mentor e aqui está ela de novo, agora no lugar que deveria, como um instrumento do qual precisamos nos aproximar, conhecer para nos movimentarmos no mundo do futuro.
Aqui vejo oportunidade para as organizações estruturarem programas de mentoria com essa finalidade, isso atenderia às duas macrotendências, preparando os líderes para as rápidas mudanças tecnológicas e revolução da IA, como também na inclusão da aprendizagem contínua no desenvolvimento da liderança.
Muitas vezes esses mentores não estarão dentro das organizações, e, talvez, nem eles próprios saibam que podem ser mentores nesses temas.
Penso também que é um excelente momento para experimentar o mentoring reverso, aproveitando a mentalidade já tecnologicamente flexível da GenZ, entendendo como eles tomam decisão e quais suportes tecnológicos podem ser absorvidos para criar essa mentalidade “future-forward” preconizada como tendência para 2025.
Vem mais por aí.
2024 está entrando em seu último trimestre, ou seja, vem muita análise e tendência pela frente. Qualquer que seja a tendência acredito que sempre podemos nos fazer as perguntas:
Onde posso aprender mais sobre isso?
Quem são as referências nesse tema?
Quem está fazendo isso na vanguarda da tendência?
Com essas respostas poderemos buscar fontes de inspiração, poderemos encontrar mentores.
A César o que é de César.
Não posso ir embora sem dizer que o jeito que adotei para escrever esse texto foi inspirado na The Update, a newsletter da HSM, escrita pela maravilhosa Adriana Salles Gomes, editora-fundadora da HSM Management. Vale muito segui-la nas redes!
Achei que esse estilo tem tudo a ver com as reflexões que fiz para produzi-lo, tendo essa sensação de um mundo onde tudo acontece num ritmo acelerado, onde cada pensamento abre uma janela de oportunidade, onde ideias emergem de todos os lados, costurando um fio condutor onde as várias conexões em volta da mesma ideia deixem registrado o que é, de verdade, importante para mim: que os diálogos permaneçam humanizados e que a gente aprenda sempre a aprender com o outro.
[1] 2023 – Intoo Survey - Unlocking Organizational Success by Supporting Employee Growth and Development [voltar]
[2] 2024 – Gallup – 6 Workplace trends Leaders should watch in 2024 [voltar]
Christine Bona é coach PCC (Professional Certified Coach) | Membro da Eight | Facilitadora de Diálogos | Mentora | Formadora de Facilitadores em Codesenvolvimento | Co-fundadora da Rede Codesenvolvimento Brasil. Buscando sempre o novo para apoiar pessoas na descoberta e construção do caminho em direção ao seu propósito.
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